Vou falar-vos dum curioso personagem: Jeremias, o fora-da-lei
Descendente por linhas travessas do famigerado Zé do Telhado
Jeremias dedicou-se desde tenra idade ao fabrico da bomba caseira
Cuja eloquência sempre o deixou maravilhado
Para Jeremias nada se assemelha à magia da dinamite
A não ser talvez o rugir apaixonado das mais profundas entranhas da terra
Só quando as fachadas dos edificios públicos explodirem numa gargalhada
Será realmente pública a lei que as leis encerram
Há quem veja em Jeremias apenas mais uma vítima da sociedade
Muito embora ele tenha a esse respeito uma opinião bem particular
É que enquanto o criminoso tem uma certa tendência natural p'ra ser vitimado
Jeremias nunca encontrou razões p'ra se culpar
Porque nunca foi a ambição nem a vingança que o levou a desprezar a lei
E jamais lhe passou pela cabeça tentar alterar a constituição
Como um poeta ele desarranja o pesadelo p'ra lá dos limites legais
Foragido por amor ao que é belo e por vocação
Jeremias gosta do guarda roupa negro e dos mitos do fora-da-lei
Gosta do calor da aguardente e de se seguir remando contra a maré
Gosta da forma como os homens respeitáveis se engasgam quando falam dele
E da forma como as mulheres murmuram: "o fora-da-lei"
Gosta de tesouros e mapas sobertudo daqueles que o tempo mais mal tratou
Gosta de brincar com o destino e nem o próprio inferno o apavora
Não estando disposto a esperar que a humanidade venha alguma vez a ser melhor
Jeremias escolheu o seu lugar do lado de fora